terça-feira, 5 de julho de 2011

A REVOLUÇÃO 1798-1793

A Revolução francesa poderia nunca ter acontecido. Um concurso de circunstancias, uma série de bloqueios e de inépcias levou, entre 1787 e 1792, á queda da monarquia. Crônica de um acontecimento quase imprevisível.
Não houve revolução, mas uma série ininterrupta de movimentos de origens diversas, com interesses frequentemente  contraditórios, cuja acumulação culminou num resultado que ultrapassou as intenções de grande parte de seus atores.
Na origem de tudo isso, e contrariamente a todas as expectativas, encontramos uma parte da nobreza de corte, rica, poderosa, influente. Privilegiados, abertos ás ideias das Luzes, mas também influenciados por Fénelon ou pelo duque de Saint-Simon, nunca perdoaram Luís XIV, por ter instaurado um sistema absolutista no qual não puderam dar livre curso ás suas ambições. O que foi chamado de “revolução dos notáveis” não passou da última tentativa do feudalismo de se vingar da monarquia. As dificuldades financeiras da coroa, que saiu sem dúvida vitoriosa, mas arruinada da guerra da américa (Independência dos Estados Unidos), servirão de pretexto. Ao impedir as reformas econômicas e administrativas urgentes e indispensáveis, a nobreza e os parlamentares acreditavam preparar seu retorno ao centro da cena política; na realidade, foi suicídio.
A fraqueza de Luís XVI, este “tirano” que não sabia que não ousava impor sua vontade real; a impopularidade da rainha Maria Antonieta, impopularidade que a corte soube fabricar e orquestrar; enfim, a crise econômica  que assolava a França com força total a partir de 1788 farão o resto. O movimento escapa ao controle daqueles que o iniciaram.
O povo das cidades e dos campos vitima do desemprego, acuado na miséria, temendo a fome, se reúne e se arma. Na primavera de 1789, em paris, os operários queimam a fábrica Réveillon; no verão, em algumas cidades do interior, castelos serão queimados. O medo e a violência estão declarados. Ninguém ser de detê-los.
A reunião dos estados gerais, uma das exigências  da assembleia dos notáveis, toma rapidamente um rumo surpreendente quando os deputados, indo além do esperado, constituem uma Assembleia Nacional. A burguesia, que parecia apoiar o movimento dos parlamentares, que manipulou o eleitorado rural – levando-o entre outras coisas, a utilizar, durante a redação de seus cahiers de doléances (documentos com reclamações e reinvindicações dirigidas ao rei), modelos preparados por ela -, joga agora o seu próprio jogo. Ela quer o poder. Ela o conseguirá e o conservará. Para seu beneficio exclusivo.
Nesse jogo, a nobreza está reduzida á sua insignificância. O povo também. Na noite de 4 de agosto, a abolição dos privilégios e a venda dos bens do clero são acompanhadas das Leis de Chapelier, que suprimem as corporações de artesãos, privam os operários e assalariados do direito de associação e do direito de greve. Prepara-se aqui o esmagamento  e a exploração do proletariado no século XIX, tudo coberto de ideais filosóficos e de exemplos das revoluções inglesa e americana.
Se muitos camponeses – frustrados com a venda dos bens nacionais frequentemente apropriados pelos burgueses, ou atingidos em suas convicções religiosas pelas primeiras medidas hostis á Igreja – se afastam rapidamente da Revolução, o povo das cidades se torna cada vez mais o instrumento das jornadas revolucionárias. De 14 de julho de 1789 a 10 de agosto de 1793, a rua parisiense destrói as bases do poder real desacreditado e enfraquecido.
Refém, a família real busca socorro no exterior. Sua tentativa de fuga , em junho de 1791, e a prisão em Varennes, evidenciando os contatos e as negociações com soberanos estrangeiros ou exilados franceses, colocam-na numa situação impossível. A monarquia constitucional, que partiu de bases errôneas – sendo que ninguém a desejava realmente -, não é viável. A partir daquele momento era necessário terminar a revolução, ou acabar com a realeza.
A esquerda revolucionária que se impõem mais intensamente a cada dia na Assembleia, nos clubes ou nas ruas, será mais rápida do que a reação real. A tomada da Tulherias em 10 de agosto de 1792, a prisão da família real na torre do temple, a abolição da monarquia e a proclamação da republica em 20 de setembro conduzem, logicamente á acusação do rei.
Saint-Just resume então tudo o que estará em jogo neste processo político, declarando: “Se o rei é inocente, a Revolução é culpada!”. Como ela não pode sê-lo, Luís XVI sobe ao cadafalso em 21 de janeiro de 1793. Ao lançar a cabeça do “ungido pelo Senhor” como desafio a França e ao mundo, a jovem república mergulha na guerra civil estrangeira. O Terror estará em breve no centro dos acontecimentos.
Por Anne Bernet – Revista História Viva – Grandes Temas.

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